terça-feira, 21 de julho de 2015

Otá - o início dos assentamentos

Por Rubens Saraceni, Retirado do J.U.S. - Pertencente ao livro "Oferendas e Assentamentos na Umbanda"
Um assentamento começa a ser construído sem pressa pelo médium, pe­ça a peça, até que ele tenha no mí­nimo sete elementos do Orixá, todos já consagrados, tanto no seu ponto de forças, quanto no seu centro de Um­­banda.
Não é preciso esperar abrir o cen­tro para começar a constituí-lo rapi­da­mente. Um dos primeiros elementos é o Otá ou pedra do seu Orixá.
O Otá equivale a "pedra funda­men­tal" das grandes construções civis ou de grandes templos erigidos no pla­no material pelas mais diversas reli­giões.
Cada Orixá tem a sua pedra (as) e é por ela que o médium deve come­çar a constituição dos fundamentos do assentamento do seu próprio Ori­xá.
Nos relatam os nossos mais velhos que, durante o período da escravidão, quando se realizava a cerimônia de ini­ciação dos noviços, estes iam mata adentro à procura do seu Otá ou pedra do seu Orixá, e voltavam só ao ama­nhecer, já com ela entre as mãos.
Dali em diante, ela seria o mais po­­deroso elo de ligação com seu Orixá. Seria conservada com zelo e ali­­men­tan­da periodicamente para manter integralmente seu axé (poder).
Normalmente ela era condicionada em uma quartinha de barro, pois a lou­ça era um artigo raro e caro, ina­cessível às classes menos favorecidas. Panelas, vasos, tigelas, canecos, e ou­­tros utensílios feitos de bar­­ro cozido, eram comuns e de uso cotidiano, não só pe­­los in­dígenas, uma vez que os co­­lo­­nizadores mais po­bres tam­bém usa­vam uten­sílios de bar­ro cozido. Eram os vasi­lhames e uten­sílios mais po­pulares e mais baratos na­quela época, cer­to?
Hoje, quando você tem os mesmos utensílios em lou­ça, pode usá-los à vontade. Até porque as quartinhas de barro precisam passar por um envernizamento externo e por um revestimento oleoso in­terno, para que a água ou outra bebida colocada dentro dela não seja absorvida pelo barro e, sob temperaturas elevadas evapore completamente.
Então, como atualmente você não precisa sair às escondidas e em altas horas da noite para encontrar na es­curidão o seu Otá ou pedra do seu Ori­xá, recomendamos que a encontre num rio ou cachoeira pedregosa e ali, calmamente, escolha-o e assim, reco­lha-o levando-o para casa já envolto em um pedaço de pano com a cor do seu Orixá.
Mas lembre-se: Não é só chegar até o leito pedregoso do rio, catar uma pedra rolada, envolvê-la num pa­no e ir embora. Não mesmo!
Há todo um ritual que deve ser cumprido à risca se quiserem que seus Otás tenham axé ou poder de reali­zação. Abaixo vamos descrevê-lo:
1- Encontrar um trecho de rio de águas limpas que seja pedregoso;
2- Numa margem dele, oferendar nossa mãe Oxum e pedir-lhe licença para recolher dos seus domínios o Otá do seu Orixá.
3 - Depois, oferende o seu Orixá na outra margem ou, se for na mesma, faça-a mais abaixo da oferenda que fez para a Senhora Oxum.
4 - Já com a oferenda feita, der­rame no rio uma garrafa de cham­pag­ne ou outra bebida doce e 7 punhados de açúcar, oferecendo-os aos Seres das Águas, pedindo-lhes licença para entrar no rio e recolher seu Otá.
5 - Isto feito, o mé­dium deve en­trar no leito do rio e pro­curar uma pedra rolada que o atraia mais que as outras e, quando encon­trá-la, deve pedir licença à Mãe e aos Seres da Àgua para pegá-la para si.
6 - Após pegá-la, de­ve elevá-la com as duas mãos acima da cabeça e, como numa oração, dizer estas palavras: "Meu Pai (ou Mãe) Orixá tal, eis a pe­­dra de axé, o meu Otá! Abençoe-o com tua luz, com teu manto divino e com teu axé, tornando-a, a partir de agora, minha pedra sagrada!"
7 - Após fazer essa primeira con­sa­gração a pessoa deve ir até onde está a oferenda da Mãe Oxum e apre­sentá-la segurando-a na palma das mãos unidas em concha, dizendo-lhe es­tas palavras: "Minha Mãe Oxum, apre­sento-lhe meu Otá. Abençoe-o, minha amada Mãe!"
8 - Após receber a benção da Mãe Oxum, a pessoa deve dirigir-se até onde está a oferenda do seu Orixá, colocá-la dentro dela e fazer esse pe­dido: "Meu Pai (minha Mãe) Orixá tal, peço-lhe que aqui, dentro da sua oferenda, consagres essa pedra de forças, esse meu Otá".
9 - Após esse pedido, a pessoa de­ve aguardar uns 10 minutos para recolhê-la e envolvê-la no pedaço de pano na cor do Orixá. Mas antes, deve dizer estas palavras: "Meu Pai (minha Mãe), peço-lhe licença para recolher meu Otá com seu axé, e envolvê-lo nesse pedaço de pano que simboliza seu manto protetor para que eu possa levá-la para minha casa protegida e ocultada dos olhares alheios".
10 - Recolha-a e embrulhe-a com o pano. Então peça licença e vá para casa.
Chegando em casa, risque um símbolo do seu Orixá, coloque-o dentro dele; acenda uma vela de 7 dias e co­loque-a dentro dele. Invoque seu Orixá, pedindo-lhe que alimente-a com sua luz viva, só recolhendo-a e guar­dando-a em um local adequado quan­do a vela for toda queimada.
Caso queira, poderá pegar uma tigela de louça colocar dentro dela um pouco de água e macerar um punhado de folhas do Orixá para, em seguida co­locar dentro o seu Otá, iluminar com uma vela de sete dias e pedir-lhe que incor­pore-lhe seu axé vegetal.
Após sete dias com o Otá imerso no caldo vegetal poderá lavá-lo em água corrente que o axé vegetal do Orixá terá sido incorporado a ele.
Só então, a pessoa poderá ali­mentá-lo com a bebida do Orixá. Para alimentá-lo poderá fazê-lo derra­man­do-a na mesma tigela usada para as ervas. O procedimento é idêntico:
Coloca-se a bebida; a seguir co­loca-se o Otá; cobre-se a tigela com o pano na cor do orixá; ilumina-se com uma vela de 7 dias e faz-se uma ora­ção para que o Orixá alimente-o com o axé da sua bebida.
Após sete dias, retire o Otá, lave-o em água corrente e coloque-o dentro de uma quartinha de louça ou de barro cerâmico;
Encha-a com água engarrafada adquirida no comércio pois não contêm cloro e coloque-a, já tampada, em seu altar, oratório ou em um local onde só você mexa.
Então, periodicamente, troque a água ou complete-a, que seu Otá passará a atuar em seu benefício, atuan­do como um ponto de força do seu Orixá.
Quando vier a fazer o assenta­mento dele, coloque nele a sua quar­tinha com seu Otá dentro dela, passan­do a alimentá-la com ela já assentada em definitivo. Aí está seu verdadeiro e genuíno "Otá"!
Temos ouvido relatos de que al­guns dirigentes espirituais adquirem no comércio algumas pedras roladas ou pedregulhos, já manuseados por ou­tras pessoas e, num ritual simples co­locam-nos dentro da quartinha dos se­us filhos espirituais onde, daí em diante estes passarão a alimentá-la periodicamente como se tivessem de fa­to o axé dos Orixás deles.
Mas isto não é verdadeiro e sim, assemelha-se a uma simpatia, que tanto pode funcionar como não.
Um Otá genuíno só deve ter a mão do seu dono e só deve ter a vibração do seu Orixá. Qualquer outra vibração incorporada ao Otá de uma pes­soa influirá negativamente sobre ele e sobre o seu dono, assim como sobre o próprio Orixá.
Isto acontece quando quem par­ticipou da consagra­ção do Otá fica de mal humor; com rai­va; com ódio dele; com antipatia por ele, etc.
Um Otá é algo pessoal e não deve ser manipulado por mais ninguém além do seu dono e só de­ve conter suas vi­bra­ções e as do seu Orixá.
Além do mais, caso a quartinha com o Otá fique nas dependências do Templo que a pessoa freqüenta, várias coi­sas podem influir sobre ela e ele tais como:
- Caso o Templo esteja sendo de­mandado os donos dos Otás também serão atingidos.
- Caso virem as forças assentadas ou firmadas no Templo, as dos donos dos Otás também serão viradas.
- Caso prendam as forças assen­tadas ou firmadas no Templo, as dos donos dos Otás também serão presas.
Caso o dirigente fique com ódio de um médium seu, poderá atin­gí-lo atra­vés do seu Otá, e qual­quer outros elementos pessoais colo­cados dentro da quartinha (pois há os que colocam um chumaço de cabelo, retirado do ori do seu filho de santo).
Recomendamos às pessoas que fo­rem prejudicadas dessa forma que com­prem 7 quartinhas de louça; con­sigam 7 líquidos diferentes, tais como: mel, bebida do seu orixá, água doce, água salgada, água com ervas ma­ceradas, água com pemba branca rala­da misturada e água de côco.
Com esses sete líquidos engarra­fados separadamente, devem ir até uma cachoeira e nela fazer uma ofe­renda a Mãe Oxum.
Após fazer a oferenda devem pe­dir-lhe licença para colher 7 pedras no leito da cachoeira. Após colhê-las colo­cá-las dentro das 7 quartinhas e acres­centar um pouco de água da ca­choeira.
A seguir, colocar as quartinhas em círculo e derramar dentro de cada uma o líquido de uma garrafa. Acender 7 velas amarelas juntas no centro do círculo das quartinhas; acender 7 ver­melhas do lado de fora do círculo de quar­tinhas, uma para cada uma.
Na seqüência, fazer essa oração po­derosa ajoelhado diante do círculo de quartinhas:
"Minha amada e miseri­cordiosa Mãe Oxum, clamo-lhe nesse momento em que sofro um ato de in­justiça, que a Senhora ative o seu Sa­grado Mistério das Sete Quartinhas e, em nome do Divino Criador Olorum, de Oxalá, da Lei Maior e da Justiça Di­­vina, que essa injustiça seja cor­tada, anulada e retardada, e que, quem a fez contra mim seja rigoro­sa­mente punido por Olorum, por Oxalá pela Lei Maior e pela Justiça Divina, as­sim como pelo Orixá, pelo Exu Guardião, e pela Pombagira Guardiã dela, que assim, punida rigorosa­men­te, nunca mais use do seu conheci­mento para prejudicar-me e a ninguém mais.
Peço-lhe também, que tudo o que essa pessoa fez e desejou contra mim, contra minhas forças espirituais e con­tra meu Orixá, que na Lei do Retorno seja voltado integralmente contra ela, punindo-a rigorosamente por ter me faltado com o respeito e com a fraternidade humana que deve reinar em nossa vida.
Peço-lhe também que essa pessoa seja punida com a retirada dos seus poderes e conhecimentos pessoais, assim como, que dela sejam afastados todos os seus filhos espirituais e seus amigos, para que não venham a ser vítimas da perfídia, da traição e do ódio dela por quem a desagrada.
Peço-lhe também que os Orixás e os Guias Espirituais de todos os filhos espirituais dessa pessoa maligna sejam alertados da perfídia dela e tomem as devidas providências para protege­rem-se, e aos seus filhos, da traição e da falsidade dessa pessoa indigna perante os Sagrados Orixás, o Divino Criador, Olorum, a Lei Maior e a Justiça Divina, e todos os umbandistas.
Que a Lei Maior e a Justiça Divina comecem a atuar e só cessem suas atua­ções quando ela pedir-lhes per­dão pela injustiça cometida. Ou, caso ela não o faça, então atuem pondo-a para fora da Umbanda para que nunca mais manche-a com sua per­fídia, traição e falsidade.
Peço-lhe e peço a todos os po­deres invocados aqui, que me prote­jam de todos os atos negativos que essa pessoa traiçoeira e perfídia venha a intentar contra mim, minhas forças, meu Orixá, minha vida e família, assim como vos peço que cada ato dela feito contra mim de agora em diante seja virado e seja revertido contra ela, punindo-a ainda mais.
Amém"!
Essa oração é tão poderosa, que imediatamente a pessoa que cometeu o ato indigno de atingir um filho espi­ritual, as suas forças espirituais e ao seu Orixá, começa a ser punida de tal forma, que em pouco tempo, ou ela desfaz o mal feito e pede perdão ao atraiçoado ou sua vida terá uma revi­ravolta tão grande que acabará afun­dando em sua maldade.
É a justa punição para quem ousa atingir o orixá alheio.
Essa magia e essa oração forte não deve ser usada para futricas e intrigas pessoais pois nossa amada Mãe Oxum não está à nossa dispo­sição para essas coisas e sim, ela nos concede a ativação do seu Sagrado Mistério das Sete Quartinhas para que atos indignos cometidos contra nossos Guias e Orixás sejam punidos rigoro­samente.
Bem, após essa magia para a defesa de vítimas de trabalhos para atin­gí-las a partir do seu Otá, conti­nue­­mos com os comentários sobre a "pedra fundamental" dos médiuns umbandistas.
Saibam que um Otá (ou pedra de força) também pode ser encontrado e recolhido em outros lugares além do leito dos rios. Pedras são encontradas na terra, no sopé das montanhas, em pedreiras, etc.
Se a sua pedra de forças (aque­la que o atraiu) for encontrada dentro de uma mata ou bosque, aí você deve pedir licença ao Orixá Oxóssi para recolhê-la e consagrá-la ao seu Orixá.
Se ela foi encontrada na terra, em algum campo aberto, peça licença ao Orixá da terra, Omulú.
Se ela for encontrada no sopé de uma montanha, ou mesmo nela, peça licença ao Orixá Xangô.
Se ela for encontrada em uma pedreira, peça licença ao Orixá Yansã.
Se ela for encontrada nas mar­gens de um lago ou do estuário de um rio, peça licença ao Orixá Nanã Bu­ruquê.
Se ela for encontrada nas margens ou no fundo de uma lagoa, peça licença ao Orixá Obá.
Se ela for encontrada a beira mar ou mesmo dentro das suas águas, peça licença ao Orixá Iemanjá.
Se for "encontrada" no comércio de pedras, aí é problema seu, certo?
Afinal, um Otá genuíno não é uma pedra semi-preciosa e sim, é um eixo rolado ou um pequeno geodo ain­da na natureza e que não passou de mão em mão.
Quando a "pedra ideal" é encon­trada, como que por acaso, e o médium não estava ali com a finalidade de encontrar seu Otá, mas deseja reco­lhê-la e levá-la para sua casa porque "sente" que ela tem algum poder ou finalidade mágica, este deve ajoelhar-se perto dela e, dependendo do cam­po vibratório em que ela se encontra, ali deve fazer uma oração ao Orixá regente dele e pedir-lhe permissão para recolhê-la e levá-la para sua casa pois já se esta­beleceu uma afinidade entre ambos.
Se você ainda não souber que tipo de afinidade se criou, recolha-a, e leve-a embora. Guarde-a e aguar­de, porque pode ser que mais adiante um guia espiritual manifeste-se e lhe dê orientações sobre ela e como tratá-la dali em diante.
Agora, se em todo o lugar da natu­reza que você for, encontrar uma ou mais pedras que o atraiam inten­sa­mente, aí já se trata de uma coisa pes­soal e o melhor a fazer é tornar-se um colecionador de pedras ornamen­tais ou raras.

obs. Texto inédito do Escritor Rubens Saraceni publicado no mês de fevereiro pelo Jornal de Umbanda Sagrada.

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